O SONHO E O MEDO


O problema reside no programa, na informação que armazenamos em nossa mente. Uma vez captada a atenção das crianças, ensinamos a elas uma linguagem, ensinamos a ler, a comportar-se e a sonhar de uma forma determinada. Domesticamos os seres humanos da mesma maneira que domesticamos um cãozinho ou qualquer outro animal: com castigos e prêmios. Isto é perfeitamente normal. O que chamamos de educação não é outra coisa senão domesticar o ser humano.

A princípio temos medo de que nos castiguem, mas mais tarde também temos medo de não receber a recompensa, de não ser suficientemente bons para nossa mãe ou nosso pai, ou para um irmão ou para um professor. Assim nasce a nossa necessidade de sermos aceitos. Antes disso não nos importa se somos ou não. As opiniões das pessoas não são importantes e não são porque só queremos brincar e viver no presente.

O medo de não conseguir a recompensa se converte no medo de ser rechaçado. E o medo de não sermos suficientemente bons para outra pessoa é o que faz com que busquemos a mudança, o que nos faz criar uma imagem. Imagem que tentamos projetar de acordo com o que desejam que sejamos, apenas para sermos aceitos, apenas para receber o premio. Deste modo aprendemos a fingir que somos o que não somos e perseveramos sendo outra pessoa com a única finalidade de ser suficientemente bons para mamãe, papai, o professor, nossa religião ou quem quer que seja. E com este objetivo agimos incansavelmente, até que nos convertemos em mestres de ser o que não somos.

Logo esquecemos quem somos realmente e começamos a viver nossas imagens, porque não criamos uma só, mas muitas diferentes, de acordo com os diferentes grupos de pessoas com quem nos relacionamos. Uma imagem para casa, uma para o colégio, e quando crescemos, outras tantas mais.

E isto funciona da mesma maneira quando se trata de uma simples relação entre um homem e uma mulher. A mulher tem uma imagem exterior que tenta projetar aos demais, e quando está só, uma outra imagem de si mesma. O mesmo acontece com o homem, que também tem uma imagem exterior e outra interior. Quando chegam à idade adulta, a imagem interior e a exterior são tão diferentes que quase não se correspondem. E como na relação entre um homem e uma mulher existem ao menos quatro imagens, como é possível que cheguem a se conhecer de verdade? Não se conhecem. A única possibilidade é tentar compreender a imagem. Mas é preciso considerar mais imagens.

Quando um homem conhece uma mulher, faz uma imagem própria dela, e por sua vez, a mulher faz uma imagem do homem a partir do seu ponto de vista. Então ele tenta conseguir que ela se ajuste à imagem que ele mesmo criou e ela tenta que ele se ajuste à imagem que fez dele. Agora, entre eles existem seis imagens. Evidentemente, ainda que não saibam, estão mentindo um para o outro. Sua relação se baseia no medo, nas mentiras, e não na verdade porque se torna impossível ver através de toda essa bruma.

Quando pequenos não experimentamos nenhum conflito porque não objetivamos ser o que não somos. Nossas imagens não mudam realmente até que começamos a nos relacionar com o mundo exterior e deixamos de ter a proteção de nossos pais. Esta é a razão porque a adolescência é particularmente difícil. Ainda no caso de estarmos preparados para sustentar e defender nossas imagens, tão logo tentamos projetá-las ao mundo exterior, este as rechaça. O mundo exterior começa a demonstrar, não apenas em âmbito particular, mas também publicamente, que não somos o que objetivamos ser.

Este seria o caso, por exemplo, de um menino adolescente que aparenta estar muito pronto. Participa de um debate no colégio, e, nesse debate, alguém que é mais inteligente, e que está mais preparado, o supera e o deixa em uma posição ridícula diante de todo o mundo. Em seguida ele tenta explicar, desculpar-se e justificar sua imagem diante de seus companheiros. Mostra-se muito amável com todos e tenta salvar essa imagem diante deles, mesmo sabendo que está mentindo. É claro, faz todo o possível para não perder o controle diante deles, mas tão logo se encontra só e se vê refletido em um espelho, sente-se um caco. Odeia a si mesmo; sente-se verdadeiramente estúpido e crê que é o pior. Existe uma grande discrepância entre a imagem interior e a imagem que tenta projetar para o mundo exterior. Pois bem, quanto maior é a discrepância, mais difícil torna-se a adaptação ao sonho da sociedade e menos amor tem para ele mesmo.

Entre a imagem que objetivou ser e a imagem interior que tem de si mesmo quando está só, existem mentiras e mais mentiras. Ambas as imagens estão completamente distantes da realidade; são falsas, mas ele não é consciente disto. Talvez outra pessoa o advirta, mas ele está totalmente cego. Seu sistema de negação tenta proteger as feridas, mas elas são reais e sente dor porque tenta defender essa imagem por todos os meios.

Desde criança aprendemos que as opiniões de todas as pessoas são importantes e dirigimos nossa vida conforme essas opiniões. Uma simples opinião de alguém, ainda que não seja certa, é capaz de fazer-nos cair no mais profundo dos infernos: «Como estás feio. Estás equivocado. És um estúpido». As opiniões têm um grande poder sobre o comportamento absurdo das pessoas, que vivem em um inferno. Por esse motivo necessitamos ouvir que somos bons, que estamos fazendo bem, que somos belos. «Como estou? Estava bem o que disse? Como estou fazendo?»

Necessitamos escutar as opiniões dos demais porque estamos domesticados e essas opiniões têm o poder de manipular-nos. Por isso buscamos o reconhecimento nos outros; necessitamos o apoio emocional de todos; ser aceito pelo sonho externo através dos demais. Esta é a razão porque os adolescentes ingerem álcool, se drogam ou começam a fumar. Apenas para serem aceitos por outras pessoas que opinam que isso é o que tem que ser feito; apenas para que essas pessoas considerem que eles estão «na onda».

Mas todas essas falsas imagens que buscamos projetar provocam um grande sofrimento em muitos seres humanos. As pessoas objetivam ser muito importantes, mas, ao mesmo tempo, acreditamos que não somos nada. Colocamos muito empenho em ser alguém no sonho dessa sociedade, em ganhar reconhecimento e em receber a aprovação dos demais.

Fazemos um grande esforço para ser importantes, para triunfar, para sermos poderosos, ricos, famosos, para expressar nosso sonho pessoal e impor nosso sonho para as pessoas que nos rodeiam. Por quê? Porque acreditamos que o sonho é real e o levamos muito a sério.

D.MIGUEL RUIZ
Tradução para o português: Eleonôra

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